Uma Civilização Doente

por soaressilva

Concebi a fantasia melancólica de um planeta hospital: toda uma civilização de gente doente sendo tratada num hospital que cobre a superfície inteira do seu planeta, além de estações orbitais em volta e algumas colônias por perto. Os próprios médicos e enfermeiros são doentes, e uma vez por dia se arrastam, ou são empurrados de cadeira de rodas, dos seus quartos nas cidades dos médicos e nas vilas dos enfermeiros, para os quartos dos meramente doentes. O Imperador é um doente como outro qualquer, num quarto só um pouco maior que os outros, e está de cama com um tubo enfiado na boca e recebendo soro pela veia; sua alta coroa está na mesinha de cabeceira desde que ele nasceu, junto com flores; o cetro está largado no sofá. O Parlamento é um quarto coletivo de doentes terminais e é possível ver, num painel eletrônico, quando um deputado acabou de morrer no meio de um debate. Há um continente para cancerosos, um continente para pessoas com insuficiência renal, o arquipélago dos cardíacos, a Península de Parkinson etc; e uma imensa ilha de paraplégicos, na qual, em alguns dias, a única coisa que se move são olhos. A ilha das pessoas que sofreram derrame desenvolveu a sua própria língua feita só de vogais. O curioso dessa civilização é que são guerreiros temidos, eficientes, sanguinários: acamados ou de cadeiras de rodas, respirando com tanques de oxigênio muitas vezes, e outras tantas no meio de sessões de químio, ou de radioterapia, seus oficiais e seus soldados nauseados e fracos comandam naves espaciais que impõem o terror em todo o espaço em volta deles. Conquistaram vários planetas; cruzaram, dizem por aí, com as populações vencidas, e espalharam suas doenças crônicas em pelo menos um terço do nosso céu visível.

Publicidade